sábado, 23 de outubro de 2010

Seda

Amigo se vai, nem té logo.
Trânsito assusta.
Amor já não há.
Meu nome nem sabe.
De mim se esquece.
Sentado finjo que não estou.
Transporte demora.
Passa rápido, nem dá tempo.
Sensação já é tarde, nem te vi.
Pra trás nisso, naquilo, naquilo outro.
Hoje, amanhã, depois.
Não caibo no trânsito.
Amor já de outra.
Amor nem meu foi.
Hospeda expulsa sem dó, nem boa noite.
Escurece meia-pálpebra, eu com medo.
Embriaga-me mente com de tudo.
Poderia, deveria outro fez, quanto a mim?
Sai de mim, oh cidade bandida, inquieta, nervosa.
Mãe de mim nem me vê, nem conhece.
Dá as costas.
Outros tantos na frente, e eu ali.
Vivo aqui - circunstância - não te gosto.
Meu amor só escrevo, nem o sinto.
Não me vês, que me importa?
A pisar-te seguindo, vou e vou.
Até quando? Não sei.
Quando adeus já vou tarde, ver-te longe.
Bem Deus queira!
A me olhar outro teto, deve haver.
Que me importa ser sua, no papel?
Aos seus filhos confunde, dia-a-dia.
Vem depressa alforria desse lugar.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Sucessão

Quem será que vem primeiro
O poder, a safadeza?
Em São Paulo dos mil nomes
O que interessa é nobreza

Aos que madrugam o sonho
De deixarem a pobreza
Aos que mandam na riqueza
Grande apego à moleza

Líder pobre, miserável?
Vejam bem, atentem sempre
Candidato não se elege
Sem alguém que o sustente

E o rico, milionário
Se diz pobre - nunca foi
O dinheiro sempre viu
Miséria - é na beira do rio

Pobre ou rico no dinheiro
Que interessa, a quem convém?
Se o poder só entorpece
E empobrece quem o tem

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Adestra

vaga cerca
                outro toma
                                 meu lugar
acalma a nascer
                        outra apressa
demoro melhor  há tempo
                                       pensamento
                                                         rumo certo
e   s   v   a    z   i    a          c   a   m   i   n    h    o
                              poluído
demoro                                                        fato
                            concorrido
flores                     artificiais                  murcham
                                                                           depressa
                                                                      não domino
d            e            s            t            i            n            o
                                                                  dúvida apressa
                                                                                        escapa
esperta cidade
                       incerta
                                 São Paulo
                                                  a me domar

Homenagem a quem

   São Paulo
                   de tantos nomes
                      Alguém chama
outro responde
                        O que falou
                                                                                                nem te olha
Bandeirante é avenida
   estrada ou herói?
      (que interessa)
           Se o que passa
                            só pensa em chegar
                                                                                                       lá longe
                                E quando chega
                                        já está na hora
de voltar

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Uma história pra São Paulo

São Paulo e o Imperador da China
(esse texto foi adaptado por mim em minha formatura no Curso de Contação de Histórias da Livraria da Vila)




"O louco é como uma folha seca em dia de ventania.
É romântico, gosta de magia e prefere a incerteza da luz de vela ao ato inseguro de caminhar no escuro.
O louco é ousado, livre e solto.
E como um alquimista, vai desenhando seu próprio caminho, sem dar satisfação sequer à sua sombra.
Ah! Se todos fossem loucos!"

Vocês conhecem o Imperador da China? Não?
Ele é o cara mais bacana que eu já conheci em toda a minha vida.
Ele morava num hospício lá em Pequim. Isso mesmo - num hospício. Justamente por pensar que era o Imperador da China. Mas não era. Porque a China, como vocês sabem, já não tem imperador, há muitos anos.

Ele gostava de morar ali. Com ele, moravam mais uns dois Napoleões, um Elvis, e até mesmo Jesus. Ali, cada um podia ser o que quisesse. Ali, tudo era normal. Tudo era sossegado.
Mas ele não era assim doido, doidão, maluco de pedra.
Também gostava de coisas que todos nós gostamos, como flores, chocolate, desenhar, ver TV.

Não tem gente que nem gosta de chocolate?
Não tem gente que vê disco voador?
Não tem gente que fala sozinha?

Eu encontrei o Chian num dia em que estava lá em Pequim fazendo uma excursão com meus amigos.
Eu acabei me perdendo deles e depois de muito andar, acabei sentando pra descansar num banco, bem ao lado do hospício.
O Chian, que estava passeando com seu monociclo, logo que me viu veio conversar comigo e me perguntou em alto e bom português:

- Você é brasileira, não é?
- Sou sim! Como você adivinhou?
- Ah! Foi fácil! Eu sei de onde as pessoas vêm pelo cheiro.
- Pelo cheiro?
- É sim!
- Quem é você?
- Eu sou Chian, o grande Imperador da China!
(Quando ele falou isso, logo eu percebi que ele era meio maluquinho, mas não falei nada. E ele percebeu que eu percebi, mas também não falou nada)

- Então, se você é o grande Imperador da China, me conta: onde aprendeu a falar português?
- Eu não precisei aprender, eu já nasci sabendo! Nós, loucos, sabemos falar todas as línguas do mundo. As vivas e as mortas. Não precisamos aprender. Já nascemos sabendo.
- Mas, me conta: onde você mora Chian?
- Eu moro aqui nesse castelo!
(falou isso apontando para o manicômio)
- E você gosta de morar aí?
- Gosto sim, aqui é bem divertido. E você? Onde mora?
- Chian, eu moro em São Paulo.
- Em São Paulo? Que legal! E você gosta de morar lá?
- Ah Chian... tem dias que eu gosto, tem dias que não gosto...
- Como assim? Tem dias que gosta, tem dias que não gosta?
- Ah... não sei te explicar... é que lá é um lugar diferente.
- Lugar diferente? Obaaaa!!! Eu adoro desenhar lugares diferentes!
(nessa hora, aconteceu uma coisa incrível: O Chian tirou do bolso, magicamente, uma caixa de lápis de cor e uma folha de papel)
- Pronto! Pode me dizer como é sua cidade?

E agora? Olhando para o Chian, com os olhinhos brilhando, esperando que eu falasse sobre a cidade mais diferente do mundo...
O que falar sobre São Paulo a um menino tão especial?
... já sei!

"Chian, desenhe um horizonte, onde a vista não alcança.
Imagine arte, música e dança.
Um dia poluído, com o céu azul de doer.
As quatro estações no mesmo dia.
Uma cidade subterrânea, que existe, mas não se vê.
Ruas sujas, mas coloridas, de tão floridas.
Desconhecidos conversando e pessoas conhecidas se encontrando por acaso, no meio de uma multidão.
Os cheiros de restaurantes do mundo todo, misturados.
Um gari, recolhendo um jornal do chão e encontrando uma poesia, que conhecia de quando era criança.
Um poeta, que de tanto odiar a cidade, resolveu cantá-la.
Desenhe a pressa. Algo como pessoas subindo escadas-rolantes em movimento.
Shoppings, monumentos, lançamentos.
Grandes eventos.
Enfim Chian... imagine um lugar onde acontece tanta coisa ao mesmo tempo, que a impressão que se tem é que não está acontecendo absolutamente nada."

Chian, maravilhado pela descrição de uma cidade tão diferente, mostra seu desenho:
- É assim sua cidade?

(Após olhar algum tempo para o papel, primeiro com desconfiança e aos poucos, abrindo um sorriso)

- É sim Chian, parabéns! Seu desenho está perfeito! São Paulo é assim mesmo!

"Uma idéia, um ideal, muitos desejos. Incontáveis possibilidades.
Uma cidade que se reinventa a cada dia.
Existem tantas São Paulos que às vezes tropeçamos nelas.
Tantas, que podemos capturar apenas retalhos de algumas
que quando juntas, formam uma.
Somos nós que construímos essa cidade,
ao mesmo tempo em que ela também nos reconstrói."

- Ahhh Chian... agora eu tenho que ir... é que falar de São Paulo pra você me deu uma saudade...
Eu acho que vou voltar pra lá hoje mesmo!
- É mesmo? Você vai pra lá hoje? Jura? Me leva com você, por favor, por favor!
- Levar você comigo? Mas como? Você não tem passaporte, passagem, autorização...
- Ah! Isso não é problema! Eu me escondo no seu bolso!
- O que?
- É!!! Eu me escondo no seu bolso!
- O quê? Se esconde no meu bolso?
(Chian fala baixinho:)

- É!!! Eu me escondo no seu bolso!

(Enquanto falou isso, foi ficando pequenininho, pequenininho... até caber aqui, na palma da minha mão. Olhando pra Chian, escuto ele dizer:)

- Nós, loucos, podemos ficar do tamanho que queremos!
(olho pro alto, e em volta, inclusive para o meu próprio corpo, digo:)
- Nós, loucos, podemos ficar do tamanho que queremos?
(Pego Chian cuidadosamente e guardo, dentro do meu coração)

Foi assim, que eu fiz a maior loucura de toda a minha vida.
Foi assim, que eu trouxe Chian comigo, aqui pra São Paulo.
Vocês querem saber se ele gostou daqui, né?
É claro! Chian, adorou São Paulo. Tanto, que como muitos de nós, nunca mais quis ir embora.
É que aqui, aconteceu uma coisa que nem ele acreditou:

Aqui, ninguém acha que ele é louco.


Autores:

(História original de Luiz Brás, escrita com letras pretas.
A parte em roxo é de minha autoria.
A parte em vermelho é de Geraldo Ramiere
http://www.gargantadaserpente.com/coral/contos/gr_sp.shtml
A parte em azul, é de autor desconhecido)


domingo, 7 de fevereiro de 2010

Ave Maria, São Paulo!

Ave Maria, quanta desgraça!
oh Senhor, que desgosto!
Aflita estou eu entre as mulheres
e maldito é o susto do bairro todo, sem luz
Santa Maria, peça a Deus
Olhar por nós, consumidores
Agora e na hora da chuva forte
Amém.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Uma semana em São Paulo

Aqui, nem todo dia é igual.
Se é segunda, olha só, dia bem cinza
por mais que faça sol.
Se é terça, que trânsito danado
(até parece uma segunda pós-feriado).
Quarta-feira pleno vapor.
Nem parece que a metade da semana ainda nem chegou.
Quinta-feira vem bonita, anunciando o dia mais azul de todos
mesmo que o céu não esteja lá grande coisa...
Sexta-feira, o grande dia! Na gravata já se vê a alegria.
A noite é badalada e nem parece fazer parte de um dia útil,
que nem devia se chamar assim, já que útil mesmo é o sábado.
Sabadão pede viagem, e a cidade vai ganhando um ar de brisa que bem se sente
Mesmo que o trânsito esteja ainda pior do que na terça-feira
que mais parecia uma segunda.
E domingo, aquele dia... até a hora do almoço, só alegria.
Mas a tarde o descanso é pesado, já que o fim do feriado se faz mais cinza do que a segunda que ainda está por vir.

O Pai Nosso do Paulistano

São Pedro que estais no céu
santificado seja vosso nome
Vem a tarde o nosso medo
Mas seja feita a vossa vontade
Se é pra chover, que caia o céu!

Que eu não esqueça o guarda-chuva no dia de hoje
esvaziai nossas represas
e assim vamos perdoando a quem nos tem esquecido
Mas não nos deixeis morrer na inundação
E livrai-nos do temporal.

Amém

São Paulo, cidade de todas as coisas

Na cidade de todas as coisas, sempre falta alguma coisa.
É praticamente impossível achar tudo o que procuramos num mesmo lugar.
Mas logo aqui, que tem tudo?
Pois é, depois que se conhece o mundo de coisas que existem,
Justamente aquela que precisamos
parece que fica faltando.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

São Paulo, por Washington Olivetto


SÃO PAULO
por Washington Olivetto


Alguns dos meus queridos amigos cariocas têm mania de achar São Paulo parecida com Nova York.
Discordo deles. Só acha São Paulo parecida com Nova York quem não conhece bem a cidade.
Ou melhor, quem a conhece superficialmente e imagina que São Paulo seja apenas uma imensa Rua Oscar Freire.


Na verdade, o grande fascínio de São Paulo é parecer-se com muitas cidades ao mesmo tempo e,
por isso mesmo, não se parecer com nenhuma.


São Paulo, entre muitas outras parecenças, se parece com Paris no Largo do Arouche, Salvador na
Estação do Brás, Tóquio na Liberdade, Roma ao lado do Teatro Municipal, Munique em Santo Amaro ,
Lisboa no Pari, com o Soho londrino na Vila Madalena e com a pernambucana Olinda na Freguesia do Ó.

São Paulo é um somatório de qualidades e defeitos, alegrias e tristezas, festejos e tragédias. Tem hotéis de luxo,
como o Fasano, o Emiliano e o L'Hotel, mas também tem gente dormindo embaixo das pontes. Tem o deslumbrante
pôr-do-sol do Alto de Pinheiros e a exuberante vegetação da Cantareira, mas também tem o ar mais poluído do país.






Promove shows dos Rolling Stones e do U2, mas também promove acidentes como o da cratera do metrô
e o do avião da TAM em Congonhas.

São Paulo é sempre surpreendente. Um grupo de meia dúzia de paulistanos significa um italiano, um japonês,
um baiano, um chinês, um curitibano e um alemão.

São Paulo é realmente curiosa. Por exemplo: têm diversos grandes times de futebol, sendo que um deles
leva o nome da própria cidade e recebeu o apelido 'o mais querido'. Mas, na verdade, o maior e o mais
querido é o Corinthians, que tem nome inglês, fica perto da Portuguesa e foi fundado por italianos,
igualzinho ao seu inimigo de estimação, o Palmeiras.

São Paulo nasceu dos santos padres jesuítas, em 1554, mas chegou a 2007 tendo como celebridade o permissivo
Oscar Maroni, do afamado Bahamas.

São Paulo já foi chamada de 'o túmulo do samba' por Vinicius de Moraes, coisa que Adoniran Barbosa, Paulo Vanzolini
e Germano Mathias provaram não ser verdade, e, apesar da deselegância discreta de suas meninas, corretamente
constatada por Caetano Veloso, produziu chiques, como Dener Pamplona de Abreu e Gloria Kalil.


Em São Paulo se faz pizzas melhores que as de Nápoles, sushis melhores que os de Tóquio, lagareiras melhores
que as de Lisboa e pastéis de feira melhores que os de Paris, até porque em Paris não existem pastéis,
muito menos os de feira.

Em alguns momentos, São Paulo se acha o máximo, em outros um horror.
Nenhum lugar do planeta é tão maniqueísta.

São Paulo teve o bom senso de imitar os botequins cariocas, e agora são os cariocas que andam imitando
as suas imitações paulistanas.
São Paulo teve o mau senso de ser a primeira cidade brasileira a importar a CowParade, uma colonizada e
pavorosa manifestação de subarte urbana, e agora o Rio faz o mesmo.
São Paulo se poluiu visualmente com a CowParade, mas se despoluiu com o Projeto Cidade Limpa.
Agora tem de começar urgentemente a despoluir o Tietê para valer, coisa que os ingleses já provaram ser
perfeitamente possível com o Tâmisa.
Mesmo despoluindo o Tietê, mantendo a cidade limpa, purificando o ar, organizando o mobiliário urbano,
regulamentando os projetos arquitetônicos, diminuindo as invasões sonoras e melhorando o tráfego,
São Paulo jamais será uma cidade belíssima.

Porque a beleza de São Paulo não é fruto da mamãe natureza, é fruto do trabalho do homem.





Reside, principalmente, nas inúmeras oportunidades que a cidade oferece, no clima de excitação permanente,
na mescla de raças e classes sociais.

São Paulo é a cidade em que a democratização da beleza, fenômeno gerado pela miscigenação, melhor se
manifesta.

São Paulo é uma cidade em que o corpo e as mãos do homem trabalharam direitinho, coisa que se reconhece
observando as meninas que circulam pelas ruas.

E se confirma analisando obras como o Páteo do Colégio (local de fundação da cidade), a Estação da Luz
(onde hoje fica o Museu da Língua Portuguesa), o Mosteiro de São Bento, a Oca, no Parque do Ibirapuera,
o Terraço Itália, a Avenida Paulista, o Sesc Pompéia, o palacete Vila Penteado, o Masp, o Memorial da América
Latina, a Santa Casa de Misericórdia, a Pinacoteca e mais uma infinidade de lugares desta cidade que não
pode parar, até porque tem mais carros do que estacionamentos.

São Paulo não é geograficamente linda, não tem mares azuis, areias brancas nem montanhas recortadas.
Nossa surfista mais famosa é a Bruna, e nossos alpinistas, na maioria, são sociais.


Mas, mesmo se levarmos o julgamento para o quesito das belezas naturais, São Paulo se dá mundialmente
muito bem por uma razão tecnicamente comprovada.

Entre as maiores cidades do mundo, como Tóquio, Nova York e Cidade do México, em matéria de
proximidade da beleza, São Paulo é, disparado, a melhor.

Porque é a única que fica a apenas 45 minutos de vôo do Rio de Janeiro. O mais importante é que com essa
distância nenhuma bala perdida pode alcançar São Paulo!

(Washington Olivetto é paulista, paulistano e publicitário).


terça-feira, 11 de novembro de 2008